O concreto da Esplanada dos Ministérios ganhou tom diferente nesta terça-feira; mais de 100 barracas estão agora fincadas na terra vermelha em frente ao Congresso Nacional
“Ocupamos este trecho do Planalto Central em um momento decisivo para as nossas vidas e as dos próximos que virão, com a votação do Plano Nacional de Educação (PNE) e a realização da 2ª Conferência Nacional de Juventude [...] Ocupamos este trecho da capital federal para impedir o retrocesso injustificável que se desenhará se o PNE não for aprovado ainda este ano. O Brasil precisa de 10% do Produto Interno Bruto aplicados, exclusivamente, na educação pública, escolas e professores do país”.
O manifesto de convocação do #OcupeBrasília, do qual trechos podem ser lidos acima e as íntegra
aqui, começou a ser distribuído logo pela manhã desta terça-feira (6/12), via redes sociais da internet. Ao mesmo tempo, na capital federal, cerca de 250 estudantes de 24 estados do Brasil tomavam a Esplanada dos Ministérios e fizeram o movimento alcançar o famoso e disputado
“trends topics” do twitter.
UNE, UBES, ANPG e cada jovem que pintou a cara no sol forte e seco do planalto central, ou cada internauta que mandou sua mensagem de apoio, faziam história a partir daquele momento. A uma quadra do Congresso Nacional, os estudantes armaram acampamento com o objetivo de acompanhar a tramitação do Plano Nacional de Educação (PNE) e reivindicar a sua votação ainda este ano, com a aprovação de uma meta de investimento público da educação em 10% do Produto Interno Bruto (PIB). Mais dois ônibus são aguardados para incorporar a ocupação, um vindo das Minas, de Uberlândia e Uberaba, e outro da vizinha Goiânia. Nesta quarta são esperados ainda estudantes da Universidade de Brasília e escolas da região.
Além de chamar a atenção da
imprensa do lado de fora com a inusitada cena das barracas, o movimento também reverberou dentro do Congresso Nacional, fazendo
pressão pelos 10 % do PIB para a educação. No momento da leitura do parecer do relator Angelo Vanhoni sobre o PNE, cerca de 50 estudantes, mesmo depois de viajarem horas até Brasília, acompanharam a audiência no Plenário 10 da Câmara.
Para as
entidades estudantis, o percentual de 8% apresentado por Vanhoni é insuficiente e não garante os avanços necessários para financiar com qualidade a educação no Brasil. Nesta quarta-feira, os estudantes vão se reunir com Vanhoni e a deputada Fatima Bezerra, presidente da Comissão de Educação da Câmara, para discutir e analisar todos as mudanças feitas no PNE.
NOSSA VITÓRIA NÃO SERÁ POR ACIDENTE
A pressão do estudantes acampados, no entanto, já colhe frutos da mobilização. A Comissão de Educação, Cultura e Esporte do Senado (CE)
aprovou na terça-feira pela manhã, por unanimidade, o
PLS 138/11, de autoria do senadores Inácio Arruda (PCdoB-CE) e Antonio Carlos Valadares (PSB-SE), que destina às áreas de educação e de ciência e tecnologia metade dos recursos do Fundo Social do Pré-sal. Criado no final do ano passado, o Fundo Social tem entre as suas principais fontes de receita os recursos do petróleo retirado da camada pré-sal do petróleo brasileiro.
O texto que havia sido aprovado pela Comissão de Serviços de Infraestrutura determina um mínimo de 50% dos recursos do Fundo Social para programas e projetos de desenvolvimento da educação pública (básica e superior). A emenda apresentada por Valadares incluiu ainda a área de ciência e tecnologia. Na versão aprovada pela CE, desses 50%, no mínimo 70% terão de ser destinados à educação básica; 20% para a educação superior; e 10% para ciência e tecnologia.
DEPUTADOS VISITAM ACAMPAMENTO
Legitimando o movimento, ao fim do dia o #OcupeBrasília recebeu a visita dos deputados federais Manuela d’Ávila, Luciana Santos, Assis Melo e Raul Enry. A representante da
Contee, Adercia Bezerra, também levou solidariedade e apoio aos estudantes.
Manuela, que é ex-diretora da UNE, reviu amigos, tirou fotos com estudantes, conversou com os acampados e falou do momento histórico vivido por cada um deles. De frente para o o Congresso Nacional, frisou a importância de todos ali estarem à frente da casa do povo, “que precisa de ter o povo mais perto” e ressaltou a participação da juventude para mudar a cara do Brasil.
A deputada defendeu bandeiras como a destinação de 50% do fundo social do pré-sal para a educação e a meia entrada para estudantes. “O mundo se expressa da maneira mais maravilhosa a partir da cultura e da arte”, disse, sobre o fato do acesso à cultura provocar transformações, principalmente, nos jovens. E brincou: “Vocês irão passar aqui dias muito divertidos, porque a melhor parte de acampar não é só a luta. Aqui também é um espaço para ser jovem, ser feliz. Aqui tem gente que pensa como a gente, aqu tem gente que luta como a gente. Desejo um bom acampamento para todos”, disse a Manu, como é carinhosamente chamada pelos estudantes.
Mesmo não estando presente, a senadora Vanessa Graziottin e a ex-presidente da UNE, Lúcia Stumpf, mandaram recados para os estudantes acampados por meio do Twitter. “Bom dia TL! Mesmo distante (África do Sul, COP 17) quero registrar o meu apoio aos estudantes brasileiros que não fogem à luta @_une e @_ubes, Eles estão acampados deste de ontem na esplanada dos ministérios em defesa da meia entrada, 10% do PIB e 50% do pré Sal p/ educação…É O OCUPA BRASÍLIA!! Força Jovens podem contar com o nosso mandato @_une @_ubes”, postou a senadora Vanessa em seu microblog.
CIDADE DOS ESTUDANTES
No acampamento com mais de 100 barracas, todas as tarefas são organizadas por meio de comissões. Alimentação, limpeza, articulação política, tudo é dividido e todos os estudantes possuem uma função na cidade, que foi planejada de uma maneira criativa, como conta o “prefeito” da ocupação, o presidente da União Estadual dos Estudantes de São Paulo, Alexandre ‘Cherno’ Silva: “Criamos bairros, ruas, avenidas e comissões para organizar o nosso acampamento que traz na sua essência a irreverência da nossa juventude”.
Os nomes dos grandes líderes do movimento estudantil e da história nacional figuram pelo espaço. Os jovens criaram no acampamento as avenidas Edson Luís e Honestino Guimarães, em homenagem aos estudantes mortos e desaparecidos na época da ditadura, o bairro Lampião e o estádio Sócrates, título escolhido para o campo de futebol. Já de uma forma bem humorada, os maranhenses construíram com 9 barracas a “Vila Sarneylândia”.
“Essa semana é decisiva para o movimento estudantil e a juventude. Hoje conquistamos, acompanhando de perto, a aprovação do 50% do fundo social do pré-sal para a educação e estamos firmes na discussão do Plano Nacional da Educação para aprovação dos 10% do PIB para a educação e a meia entrada para os estudantes em eventos culturais e esportivos. Esta ocupação está em consonância com o movimento pela luta da liberdade, tornando a juventude como a ponta de lança da transformação”, convoca o presidente da UNE, Daniel Iliescu.
QUEM É QUEM NO #OCUPEBRASÍLIA
De diferentes estados, sotaques e costumes. Estes são os rostos que, pintados das cores da nação, constroem o momento histórico da juventude brasileira. Muitos estudantes estão fora de casa a uma semana e vieram para Brasília mobilizados após o 39º Congresso da UBES (Conubes), como a secundarista do estado do Pará, Laura Eli. “Ficarei aqui acampada o tempo que for necessário para a aprovação de todas as nossas pautas. Acredito na luta dos estudantes e quero contribuir representando o meu estado”, garante.
Bianca Innocenti, estudante secundarista de Santa Catarina, viajou cerca de 16 horas até São Paulo, para o Conubes. Depois de 3 dias participando do encontro, com diversos debates e a eleição da nova presidente da entidade, a estudante viajou mais 18 horas até a capital federal. “Estou aqui para ajudar a mudar a história do nosso país e fazer com que o movimento dos caras-pintadas volte novamente a transformar a nossa sociedade, desta vez com a luta pela conquista dos 10% do PIB para a educação”.
“PELADA DA MEIA”
Em uma brincadeira em tom irreverente, os jovens pretendem realizar todos os dias uma grande “pelada da meia”, na qual a única regra é estar vestido apenas de meia, sem chuteiras ou tênis. O jogo de futebol faz uma alusão à luta das entidades estudantis para garantir o direito à meia entrada para os estudantes nos jogos da Copa do Mundo de 2014 no Brasil.
Uma série de atividades culturais estão programadas para acontecer no #OcupeBrasília, entre elas shows de música, sessão de cinemas e saraus, organizados pelos próprios estudantes. De Santos, litoral de São Paulo, a juventude traz o tom na crítica usando como base o Hip Hop, enquanto os estudantes de Santa Catarina preparam para o encontro, cenas de teatro e contação de história. O CUCA do Rio de Janeiro realizará oficinas de circo, poesia e expressão corporal e uma grande gincana entre todos os estudantes, fechará a programação.